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quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

A Escolha do Jorge: "Três Filhas de sua Mãe"


“As minhas três filhas são o meu bordel.” 
(p. 148)

“Três Filhas de sua Mãe” de Pierre Félix Louÿs (1870-1925) encontra-se publicado na colecção Eróticos da Guerra e Paz e mostra-se como uma pedrada no charco face à imensidão de livros publicados nos últimos anos, muito na sequência da edição de “As Sombras de Grey” e afins. Escrito em 1910, mas publicado somente, em 1926, após a morte do escritor e de modo clandestino, “Três Filhas de sua Mãe” derruba todos os muros da moralidade e valores de tradição judaico-cristã. Tudo aquilo que é comummente associado a comportamentos desviantes no que concerne à sexualidade, ganham impacto nesta obra que, mais de um século após ter sido escrito, é necessário ter estômago e cabeça para assumir as descrições pormenorizadas como sendo normais. “Sou muito católica. Sou quase devota. Um pároco disse-me que era o maior pecado que eu podia fazer. Desde que sei isso, faço-o todos os dias.” (p. 147)
      Pierre Félix Louÿs apresenta-nos uma obra em que não existem quaisquer limites na experiência sexual vivida, na medida em que a mulher é colocada no centro das atenções, sendo apresentada como emancipada, mas ao mesmo tempo libertina, porque precisa satisfazer os seus desejos mais primitivos, explorando ao máximo as potencialidades do seu corpo na busca do prazer, utilizando o homem como um mero instrumento para satisfação dos seus desejos. É a mulher quem controla o
acto sexual. É ela quem domina e quem dirige. É a mulher quem toma as rédeas e que decide o que fazer com o órgão sexual masculino para a satisfação dos seus desejos mais íntimos e, quiçá, mais pérfidos, por puro deleite, para a obtenção de um prazer que se pretende que seja cada vez maior.
      O narrador, um jovem de vinte anos, tornou-se um frequentador do bordel de Teresa, uma mulher na casa dos trinta anos, que iniciou as suas três filhas na prostituição, muito precocemente. Charlotte tem 20 anos, Mauricette, 14 anos e Lilly, apenas 10. O narrador, ainda que muito jovem, e percebendo-se um claro conhecedor dos prazeres do sexo e dos corpos das mulheres, é com frequência que pasma, quase enlouquecendo com as descrições da vida sexual das mulheres deste bordel familiar e das experiências a que se submeteu ao ponto de vivenciar sensações totalmente novas e não menos intensas.
      “Não pude ouvir mais. Estava moralmente esgotado. A minha fadiga física ultrapassou mesmo todas as medidas. Sem dúvida, depois de uma longa espera que eu acabava de suportar, e durante dois minutos, fiquei sozinho na cama, sem movimento e sem pensamento.” (p. 148)
      O bordel de Teresa cumpre desta forma duas funções: satisfazer os homens que buscam o prazer nos corpos das mulheres que não as suas esposas e onde nenhum dos intervenientes está sujeito à moral cristã; e também, a gradual emancipação da mulher através da vivência em pleno da sua sexualidade.
      Pierre Félix Louÿs em “Três Filhas de sua Mãe” apresenta-se como uma obra revolucionária e subversiva, mesmo para os nossos dias, na medida em que, derrubados os muros da moralidade, a perversão e a libertinagem assumem-se como a regra, a liberdade e libertação sexuais em si mesmas.
Assim, “Três Filhas de sua Mãe” apresenta todo um menu salteado de experiências sexuais, no entanto, alguns dos pratos serão certamente de difícil digestão, como a sodomia, safismo, escatologia, incesto, pedofilia e bestialidade. “Pensas que o que nos enoja são as coisas que fazemos; não, são os homens.” (p. 78)
      Com uma linguagem clara, objectiva e toda ela a chamar as coisas pelos nomes, com tudo muito explicadinho para que não restem dúvidas, a par de cenas hilariantes, “Três Filhas de sua Mãe” é uma obra marcante no que concerne à literatura erótica e que agora foi recuperado passado um século após ter sido escrito.
      E em jeito de apaziguamento e acalmia, “Três Filhas de sua Mãe” termina com o seguinte trecho: “E, com efeito, nada é mais comum do que ver três irmãs renderem-se na mesma cama e tomar à vez o mesmo homem por amante. Isto é formalmente condenado pelos antigos mestres da teologia moral, mas as mães já não metem nas mãos das suas filhas bons livros nos quais se imprime: «Não vá para a cama com o amante da sua irmã, cometeria um incesto.» As meninas têm sempre desculpas.” (p. 251)

Texto da autoria de Jorge Navarro

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