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terça-feira, 4 de junho de 2013

A Convidada Escolhe... "O Assassino Cego"


Este é um livro notável que se desdobra em três narrativas distintas, todas marcadas pela excelente escrita da autora bem como pelo seu estilo acutilante e irónico onde se vislumbram algumas passagens de grande beleza literária. Através das suas páginas acompanhamos a vida de Iris, uma idosa de 83 anos que resolve contar a história trágica do seu passado e da sua família. Recuamos então até ao início do século XX, á infância privilegiada de Iris no seio de uma família abastada ligada à indústria que será fortemente abalada pelas consequências da I Guerra Mundial e pela Grande Depressão. De um momento para o outro o frágil equilíbrio e a prosperidade desta família começa a desmoronar. Aquilo que parecia eterno, inquestionável, gravado na pedra revela-se afinal tão impermanente quanto o mundo e Iris será colocada perante decisões muito difíceis ás quais tenta responder tanto com a razão e sentido de dever familiar, quanto com a emoção.

 Como em todos os livros da autora que li até agora, “O assassino cego” confronta-nos fria e duramente com questões sociais graves como as consequências materiais e psicológicas da guerra, a ganância do ser humano que teima em acumular riqueza mesmo que seja à custa da miséria dos seus semelhantes, a violência doméstica, a subalternização da mulher na sociedade e até a pedofilia. Apesar de tudo isto, não considero que seja um livro desprovido de esperança, é antes um alerta para nos levar a reflectir, mais uma vez, nos nossos valores e nos da sociedade a que pertencemos. Nesse sentido, este é, a meu ver, um livro com implicações políticas e éticas; uma interrogação sobre a sociedade de consumo, nascida da revolução industrial, que ainda hoje domina as nossas vidas.

Uma leitura que apreciei muitíssimo e que recomendo sem hesitar.

“O verdadeiro perigo vem dela própria. O que permitirá, até onde está disposta a ir. Mas permitir e estar disposta não têm nada que ver com a questão. Para onde será empurrada, então; para onde será conduzida. Não examinou os seus motivos. Pode não haver nenhum motivo propriamente dito; o desejo não é um motivo. Não lhe parece que tenha qualquer escolha. Um prazer tão extremo é também uma humilhação. É como ser puxada por uma corda vergonhosa, um a trela á volta do pescoço. Ela ressente-se disso, da sua falta de liberdade, portanto estica o tempo entre os encontros, racionando-os. (…)

(…) Mas no fim volta sempre. Não vale a pena resistir. Procura-o em busca de amnésia, de esquecimento. Rende-se, é apagada; entra na escuridão do próprio corpo, esquece o seu nome. Imolação é o que ela quer, embora brevemente. Existir sem fronteiras.”

Renata Carvalho

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